sexta-feira, 28 de março de 2014

Esposendenses pelo Mundo (2)

Artur Silva, 28 anos, natural de Apúlia, é engenheiro de telecomunicações e reside em Brno, República Checa, onde trabalha.

Em terras de cerveja mundialmente reconhecida, onde se situa a cidade milenar de Praga, e onde nasceu Franz Kafka, fomos falar com este jovem esposendense espalhado pelo mundo, e conhecer um pouco da sua história e das suas impressões sobre a República Checa e Portugal, nunca esquecendo, claro está, a terra que o viu nascer e crescer.
Imagem: Artur Silva, Brno

Há quanto tempo vives na República Checa?

Estou a viver na República Checa, mais concretamente em Brno, há dois anos e meio.

Qual foi a primeira coisa que te impressionou no novo país ao cabo dos primeiros dias?

O silêncio em espaços públicos, como estações de comboio e autocarros, e o civismo das pessoas.
Os transportes públicos também me impressionaram muito. Sempre pontuais e a circularem para todo o lado.

Aprender uma nova língua foi necessário, ou o inglês serve para tudo?

O inglês acaba por servir.
Claro está que no dia-a-dia, em situações como no supermercado ou pedir indicações na rua, o checo é sempre uma mais-valia. No entanto, embora esteja a viver cá há quase 3 anos, a verdade é que pouco mais sei em checo do que pedir comida no restaurante. O checo é uma língua muito difícil de aprender e de falar (risos).
À medida que o tempo passa, noto que Brno fica cada vez mais preparada para os estrangeiros. Os mais novos, normalmente, conseguem comunicar em inglês.
Existe uma comunidade bastante grande de imigrantes altamente qualificados (muitas multinacionais têm centros cá) e nessa comunidade existem também bastantes portugueses, bem como estudantes de Erasmus.

Quais são as principais diferenças que notas entre Portugal e a República Checa?

O clima e a mentalidade das pessoas.
O clima é diferente, com partes más e partes boas.
As más são que, por exemplo, aqui faz mais frio no inverno, e às vezes (poucas) há chuva gelada, o que é muito perigoso porque o chão fica com uma camada de gelo uniforme e sair de casa significa automaticamente que vais cair no chão, o que não é nada bom.
As boas é que aqui não faz vento e a humidade é muito baixa, portanto sente-se menos frio do que em Portugal no Inverno, e menos calor no Verão. Por exemplo, 5 graus negativos cá são menos severos do que apanhar com a nortada na marginal de Esposende quando estão 7 graus!
Quanto à mentalidade das pessoas, na República Checa as pessoas são mais fechadas.
A privacidade é respeitada no sentido em que ninguém quer saber da vida dos outros. Claro que há sempre o habitual “cochicho” no escritório acerca disto ou daquilo, mas de um modo geral cada um vive a sua vida sem perder muito tempo com comentários acerca da vida dos outros.
Imagem: Brno, República Checa

Como é que caracterizas o típico «checo», desde o colega de trabalho, passando pela pessoa que te atende num café ou serviço público?

Os checos são, de um modo geral, pessoas frias e fechadas.
Não são um povo que ofereça sorrisos de forma gratuita como os latinos, por exemplo.
São também pessoas eficazes que fazem o que têm a fazer e não estão com muitos “salamaleques”.
Por outro lado, quando se cria empatia e confiança com os checos, revelam-se pessoas surpreendentemente muito bem-dispostas e prestáveis.

Como é que se ocupam os tempos livres na República Checa?

Viajar (dentro e fora do pais), estar com os amigos nos bares, e quando o tempo está solarengo fazer actividades ao ar livre, como andar de bicicleta.
Há sempre meetings, com várias actividades, para os estrangeiros que vivem cá.

Para além de Brno, e a inevitável Praga, há mais algum lugar (ou lugares) da República Checa que conheças e tenhas gostado particularmente?

A Republica Checa é um país muito bonito para se visitar.
Quase todas as cidades e vilas têm os centros históricos bem recuperados e impecáveis, super limpos e exclusivos para peões.
Há muitas cidades com o título de património mundial da UNESCO.
Cesky Krumlov é na minha opinião, e sem qualquer dúvida, a vila mais bonita do país.
Imagem: Cesky Krumlov, República Checa

A República Checa iniciou-se há poucos anos na União Europeia, mas é um país a que ainda associamos imediatamente uma história de forte presença comunista. São duas realidades que se sucederam no tempo e na prática, ou ainda coexistem entre si?

Sim e não.
Acho que a ideia que as pessoas têm da República Checa ainda ser comunista é errada. A nível político o país está longe do comunismo. No entanto, há a herança comunista que é inevitável.
O nível de formação é altíssimo cá. Por exemplo, fazer um mestrado é o habitual para os estudantes de cá, e há muitos estudantes a fazerem doutoramentos.
O lado mau, por exemplo, é que um médico em início de carreira ganha quase tanto como um operador de caixa que faça noites num supermercado...
Os transportes públicos oferecem um serviço incrivelmente fiável e completo em regime 24 horas, todos os dias, incluindo fins-de-semana, por preços muito baixos (o passe custa cerca de 20 euros por mês).
Outra parte da herança comunista que se vê na República Checa é a que respeita à habitação. Com efeito, as casas são pequenas e as pessoas estão habituadas a isso.
Arrendar um apartamento segundo o standard português fica bastante caro, na ordem dos 500 euros ou mais, por mês, para um T0.
Quanto à actual situação das pessoas, pelo que me contam, nos anos 90 houve uma corrida ao estilo de vida e consumo de marcas ocidentais. Hoje em dia é óbvio que a República Checa é uma sociedade bastante consumista, mas que se preocupa menos com as aparências do que Portugal. Compram o que gostam porque querem, e não para exibir.

Que visão têm os checos sobre Portugal e os portugueses?

A maioria dos checos olha para Portugal como um destino de férias, mas a opinião que têm sobre Portugal é boa.
Quando vim para cá em 2011, falava-se bastante na crise e no resgate do FMI. Notava-se que os checos tinham alguma “pena” dos portugueses pelo que tinha acontecido à economia portuguesa. Mas, apesar disso, a opinião continua a ser boa.
Não me senti minimamente discriminado aqui, muito pelo contrário. Surpreendeu-me também que bastante gente fale português, e os checos que visitaram Portugal adoraram o nosso país. Das pessoas com quem falei, a opinião é unânime!
  
Como é que se olha para Esposende a partir da República Checa?

Acho que a forma como olho para a minha terra não mudou muito.
O meu principal choque cultural deu-se há 6 anos atrás quando fiz ERASMUS na Lituânia, mas nessa altura ainda era um miúdo.
Hoje em dia, ao olhar para trás com um pouco mais de calma, e com os pés assentes no chão, considero que o que temos em qualquer lugar é o que faz desse lugar característico.
Já vivemos na Europa em que temos tanto em comum em todo o lado, que se apontarmos o dedo e tentarmos mudar tudo para igual, perdemos a nossa identidade.
Esposende a Apúlia são terras lindas com virtudes e defeitos que as caracterizam.

À sua escala, que prática (s)/medida (s) de bom que encontras em Brno achas que poderia muito bem vir a ser aplicada em Esposende?

Tão simples e básico quanto isto: serviço Drink&Drive!
Na República Checa, a tolerância ao álcool é zero (por contraponto com Portugal, em que a tolerância para a generalidade dos condutores vai até 0,49 gramas de álcool por litro de sangue), e as multas são extremamente pesadas.
O serviço Drink&Drive está vocacionado para as pessoas que vão no seu carro para os copos (ou não fosse a cerveja checa a melhor cerveja do mundo), e no regresso, em vez de virem por conta própria, com todos os riscos a isso associados, ligam para um serviço que vem ter com a pessoa e que conduz o seu carro até casa. Note-se que por este serviço o preço praticado é praticamente o mesmo que o preço de um táxi!
Se tivéssemos um serviço desde género em Esposende (dava imenso jeito para as noites no Pachá e no Bibofir), penso que seria um projecto pioneiro nas redondezas, desde logo porque contribui para tornar as estradas mais seguras.

Quem visitar a República Checa, que lugar e que prato não pode perder?

Quem visitar a República Checa tem de provar as suas cervejas. Há para todos os gostos e feitios (risos).
Quanto à comida típica, existe a Svickova (carne de vaca estufada com molho de arando por cima), que é boa, embora não morra de amores por ela.
Mas para quem vier a Brno e queira comer bem e a bom preço, deve ir ao Starobno (a cervejaria da fabrica de cerveja local) que eu tenho a certeza que fica satisfeito!
Imagem: Lednice, República Checa

Ao voltar a Esposende qual é aquele lugar a que apetece sempre voltar?
Ir ver o mar tem de ser a primeira coisa a fazer, e depois ir tomar um café ao Maré Baza para estar com os amigos!



Esposendenses pelo Mundo” é uma rubrica que pretende dar a conhecer os “esposendenses” espalhados pelos 4 cantos do mundo, partilhando as suas impressões sobre os novos lugares que habitam, os povos e culturas com quem convivem, e o seu olhar sobre a terra que os viu nascer e crescer.
Se conheces algum “esposendense” espalhado pelo mundo, ou se és tu próprio um “esposendense” espalhado pelo mundo, e gostasses de ver a sua/tua história aqui partilhada, escreve para largodospeixinhos@gmail.com, com indicação do nome, país e contacto de e-mail ou FB.  

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